Fiesta, o Sol nasce sempre
Durante muito tempo, muitas democracias viveram da alternância entre duas forças políticas.
Tinham elas programas claros. Dirigiam-se ao universo maior dos cidadãos. Compreendiam estes que num momento ou noutro se impunham soluções governativas opostas.
Até que a exigência económica do tempo deixou uma margem muito ténue de diferenciação.
Esquerda ou direita baralhavam as contas dos eleitores e tornaram-se mais difíceis de distinguir do ponto de vista ideológico.
Neste percurso, curiosamente, os partidos comunistas foram por água abaixo. O modelo União Soviética desapareceu e o credo rígido descobriu-se anquilosado.
Foi assim na Itália, na França, na Espanha, na Grécia e está a ser em Portugal.
É, verdadeiramente, uma inevitabilidade histórica.
Voltamos à arrumação do eleitorado em duas grandes áreas.
O que mudou, entretanto?
No processo que se seguiu, a esquerda foi enfraquecida por divisões. Formaram-se partidos que contestavam o percurso dos maiores, a sua deriva para o centro.
E, com isso, ficou mais difícil o acesso ao poder.
Perdiam para os grandes partidos da direita ou do centro e, em virtude da sua rigidez ideológica, eram incapazes de se unir.
Até que surgem os exemplos de Portugal e da Espanha.
O que nestes países aconteceu foi que a esquerda foi redefinida como local de rendez-vous.
Era muito o que separava os concordantes mas o perfume do poder tornou-se irrecusável.
Os partidos radicais da esquerda inventaram os temas fraturantes e neles fizeram convergir os socialistas. Eram uma moeda de troca aceitável e pouco exigente.
O governo que apoiavam assumia o equilíbrio orçamental, as cativações, a estagnação dos serviços públicos a política do passo mais curto que a perna.
E foram felizes.
Até que se começou a perceber que as questões fundamentais não tinham solução.
Neste equilíbrio instável, como se poderiam aguentar?
O segredo é a promoção da direita contestatária, a sua transformação em monstro (sagrado, embora), o regresso ao antifascismo como cimento bloqueador.
O que são estes partidos ditos de direita?
Não se sabe, exatamente.
Juntam negacionistas, populistas, contestatários, radicais, mas o que, na realidade, são é muito convenientes.
Sabem eles, porque não são distraídos, que conseguirão tanto ser maioritários como a esquerda radical.
Mas a sua secreta esperança é participar do poder, influenciá-lo.
O resultado é que os eleitores da direita estão na situação que outrora foi da esquerda, longe de conseguir formar um governo.
O impasse espanhol representa isto mesmo.
Em Espanha com requintes de engenharia. Uma nova formação da esquerda surgiu de um governo impossível de manter. A sombra da eterna questão catalã é o último refúgio.
Talvez que os eleitores do Vox tenham percebido o logro.
Terão conseguido duas coisas: mostrar que não são suficientes para uma maioria e levar, de novo, Sánchez ao poder.
Mas, se por acaso fossem parte da maioria, por participação ativa ou por atitude permissiva, também poderiam ser levados a concluir pelo seu enfraquecimento.
Esta, assim definida, direita não tem programa nem destino. Une o outro lado no papel de lebre. Empata.
Concordo com tantos que se têm pronunciado, os eleitores portugueses compreenderão.
Em Fiesta, escreveu Hemingway: «Oh, podíamos ter passado juntos uma vida bestialmente boa!